domingo, 7 de junho de 2009

Indigesto

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Indigesto

...........................A alguém

Tome,
engula de uma só vez
estas linhas mal elaboradas,
colocadas em provável ordem inteligível
oferecendo certa plasticidade
quase agradável aos olhos,
mas carente de qualquer conteúdo
que instaure uma aparente verdade,
já que é desta forma que se configura
ante seu olhar que varre displicente,
o que se instala na superfície das coisas.
Deguste-a com o interesse que lhe convém,
que seja recebida num inevitável vômito,
ou em lenta e cuidadosa degustação,
que lhe traga a desejada satisfação
ou produza o já constante enjôo,
consumado como ponto referencial
de um parâmetro crítico constante
ante a criação que brota do outro.
Talvez o meu alimento não traga
a satisfação necessária e desejada
ao vacilante e vazio invólucro de poses,
incomodado, não com a construção em si,
mas de onde ela ousa surgir;
entretanto, isso não confirma nem evidencia
um possível vazio ou um duplo de outro signo
que já viaja no percurso de sua verdade.
Talvez o preguiçoso estômago
acostumado à letargia e parco em músculos,
condicionado ao previamente digerível
não absorva a substância essencial
constituída no interior do alimento,
então perceba que o óleo em que me fritas
carece da quentura que só o tempo oferece
e não ouse colocar-me na prateleira dos semi-prontos,
onde constantemente tem o hábito de se abastecer.
Deixo que dispa-me do excesso que transborda
da ornamentada linguagem que se mostra
ou cubra-me com o manto da vergonha
ante os inúmeros e subseqüentes horrores
que gritam da página ao seu afinado ouvido.
Só não retire o mérito que me cabe
como insistente operário da palavra,
não aquela que viaja na gratuidade
do inalterado e sufocante vazio,
nunca abastecido na totalidade,
que tanto conheces quanto repudia.
Recuso fartar-me de tão abundante prato,
confortavelmente instalado
no verbo distorcido e alheio,
construindo seus imutáveis dias,
agrupando-os em patética substituição,
meras datas agrupadas e enumeradas,
despercebidas na contínua construção
que se transmuta em verdade e vida,
eclodidas no infinito arroto da alma.

Ninil





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