sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Chama



















Chama



Toque de recolher soando nas calçadas

somente recolheu as antigas amarras

encharcadas em ecos de gritos sufocados,

soprou dos olhos as camadas de poeira
instaurando na retina o reflexo das ruas

retomando o brilho ofuscado pela tela.

Reza soprando raivosa o canto do meio-dia

entre o ranger de dentes despedaçados,

cuspindo o hálito amorfo e resignado

pago em regozijos bélicos e tronos eternos.

Reza irrompendo canto furioso ante sirenes,

lágrimas involuntárias lavando o novo olhar

trazendo na íris a quentura do deserto

queimando...

como a chama silenciosa que acorda.


Ninil



Tom Waits - "God's Away On Business"

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Chuva

.


Foto: J B Neto


Chuva


Goteira martelando a cabeça

Fio de paciência sugado pelo ralo

Esgoto cuspindo tudo de volta

Ossos novamente enregelados

Jorro contínuo céu abaixo

na beleza cristalina coreografada

O choro, o grito, o medo, a lama

O sofá e a TV assistem à calçada

O carnê, a conta e o imposto

boiam em fragmentos imundos

entre os corpos de volta à terra

num interminável abraço coletivo.


Ninil




sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Chuva


Foto: William Gedney



Chuva

Sopro.

Olhos vendados na claridade

lambendo o brilho molhado

sob o calçado, sob o pneu, sob a luz.

Projétil do olhar engolindo o silêncio

asfalto, calçada, postes encharcados

asas chacoalhando gotas no fio

fio de água no canto da pedra

grama dançando a umidade no ventre.

Gotas rasgando o infinito invisível

batendo nas latas, nas folhas, na pele.

Encharcada, repleta e chorosa

lava o instante por inteiro

sai flutuando vaporosa e breve

entre eletricidade e explosões.


Ninil

Foto: Ninil

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Dead Can Dance - Yulunga

.



.

O canto (exercício sub-mântrico irregular)


.




O Canto



Me encanto com o canto

que brota em sutil acalanto

destituindo da facilidade do pranto

a óbvia construção do desencanto

ante o desenrolar desse manto

onde não se assemelha o quanto

à mágica emanação do canto,

escorrendo dos lábios em equilíbrio tanto!

Se espalhando por todo canto

não medindo quanto nem portanto

apenas distribuindo seu encanto.


Ninil







.