domingo, 24 de abril de 2011

Casa

Defrag - 'Nebu




 
Casa


Os pombos que arrulhavam no forro que não tenho

Impediram-me de dormir metade da noite pra trás

na confusão de bater de asas e bicos dentro do sofá

que foi vendido a alguém na semana passada.

O pingo de água prestes a desabar da torneira

retrocedeu impetuoso pelo corpo metálico

deslizando e desaparecendo no tubo ressecado.

Os alto-falantes absorviam as notas do vento

ruídos externos e o abraço contínuo da poeira.

A TV desconectada de sua elétrica alimentação

refletia apenas lentos vultos na tela apagada.

As molas da cama perfuravam o corpo acordado

horizontalizando-se mediante o peso do invisível.

A descarga sugou juntamente com os dejetos

o corpo que se ocupava das sobras inexistentes

do alimento que boca alguma se apraz em comer.

Os livros trepidavam no fogo contínuo do ser

encharcado pelo sereno incessante do mundo

depois que o telhado perdeu sua utilidade.


Ninil




sexta-feira, 22 de abril de 2011

Maracatu



Maracatu


Solo tremendo sob a explosão do couro

séculos rompidos na continuidade indivisível

erguidos em uníssona batida atemporal

rasgando o concreto em direção ao útero

telúrico aconchego ancestral perpétuo.

Súditos da folia-rainha dos corpos insanos

súbitos reinos erguidos da realeza de cada um

cortejo rasgando o ar em involuntária dança

sublevada pela imprescindível necessidade

do movimento orquestrando o ritmo do ser.

Turba rumando flutuante a qualquer ponto

estabelecendo seu espaço dentro do som

dentro de cada batida resgatando o contínuo

na estrada reconstituída ao elo passado

aconchegando todos em única nota infinita.

Cortejo explodindo os viciados tímpanos

na insistente e barulhenta caixa torácica

estilhaçando qualquer sinal de mínima inércia

instaurando a atemporalidade sonora

sob a entrega dos corpos que flutuam

dentro de cada batida do tambor do peito.


Ninil


  Fotos: Ninil