quarta-feira, 21 de abril de 2010

Remédio

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Ilustração: Charles Bell. (1865). Do livro "The anatomy and philosophy of expression: as connected with the fine arts"


Remédio

Ávido olhar buscando a posologia
na bula que justifica a necessidade
do remédio que envenena os olhos,
a boca e todas as ansiosas células.
doce-feroz toxina que flui dos poros
inundando o ser da bem-vinda doença,
implodindo os enlouquecidos termômetros
ensurdecendo o ritmo dos estetoscópios
amenizando o batuque desenfreado
que silencia o corpo por inteiro.
Posologia que pede utilização completa
do que está contido em todo frasco
num único e derradeiro gole.
O silêncio da farmácia vazia
grita as dores contínuas do corte
ansiando ser impetuosamente preenchido
não pelas inúmeras poções tranqüilizadoras
mas pelos invisíveis remédios escondidos
no brilho líquido das retinas
no calor explodindo o peito
em cada gota de suor fluindo
revitalizando a vacilante carcaça
inundando-a do amargo remédio
transfigurado em néctar necessário
Aquiescendo à vontade da ferida
Amenizando o grito do que é incurável.

Ninil





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